sexta-feira, 31 de janeiro de 2020

A bênção no paraíso - Parte I


                O tempo se abriu. O azul do céu limpo, com nuvens de espessura ignorável ao longe, brilhava tanto que deixava o mar com um aspecto de quilômetros incontáveis de cristal andara. A areia branca da praia, em contraste com as pedras que as ondas encontravam, fazia com que o cenário ficasse milhões de vezes mais rico. Não para fotos, mas para admirar a olho nu e se perguntar eternamente como seria possível. As rochas, algumas lisas e outras em formato repuxado, como se a água e o vento tivessem quisto que elas fossem mais para longe, com rasuras de um vertical preciso, brilhavam com o nascer do sol por trás do monte. Deus jogou vida naquele dia. Com uma pitada de sal e ansiedade.

No dia anterior

                Era 19 de janeiro. O tempo estava enuviado pela manhã, com o sol por trás, por vezes presente. Saímos com o carro do estacionamento do motel, que foi suficiente para dormirmos quatro horas depois de um dia cheio e uma viagem cansativa, e pegamos a estrada. O caminho era longo. Extensos 300 km de Fortaleza até Jijoca, onde o maior trecho do trajeto era em pista de mão dupla. Quando o visor da trip estava apontando mais da metade do caminho, uma tempestade resolveu lavar tudo que tinha sobre a Terra. Buracos. Reduzimos a velocidade.

                Era a véspera do grande dia e a chuva não cessava. Conforme chegávamos perto do destino, o céu ficava mais cinza. Nós tínhamos todas as ferramentas para cair em desânimo e pensar que deu tudo errado. Mas a fé que anima nossa alma era bem mais forte que aquela água que não caía com tanta violência naquele local há muito tempo. De Jijoca, mais quarenta minutos nas dunas alagadas do parque nacional Chico Mendes até a vila de Jericoacoara. Valetas cheias de água que mais pareciam novas lagoas dando um alô ao paraíso. O tempo e água eram turvos. Um marrom claro misturado ao cinza. Lameado. Areia úmida.

                Nos instalamos. Parou de chover. Saímos para almoçar. Chuva novamente. Nos concentramos. Entramos numa meditação de olhos abertos e mente funcionando tão profunda que a energia dos bons ares se dissipou por toda a região. À noite, já com estrelas dando indícios de glória, à porta da capela de Nossa Senhora de Fátima, eu escrevi meus votos, enquanto ela provava a maquiagem no quarto da pousada. Entrei, me ajoelhei. Próximo ao altar, uma dúzia de jovens ouvia do catequista orientações sobre os costumes católicos. Fechei meus olhos e rezei.

“Senhor, ilumine a minha segunda-feira com um sol lindo e um dia maravilhoso. Leva para longe sua tempestade, fazendo-a cair numa outra oportunidade. E, principalmente, se coloque em nossos corações para o dia de amanhã. Coloco em suas mãos as nossas vidas. Amém”.

O dia

                Era pouco mais de 5h quando o celular despertou no quarto da pousada. As janelas e cortinas fechadas impossibilitava de ver como estava o dia lá fora. Nos preparamos e saímos. Como num sopro divino, o sol nascia por trás do monte, livre de qualquer obstáculo. Consegui ver de longe o sorriso dele para mim. Saímos para um ensaio fotográfico em um dos lugares mais incríveis que já fui. Foram mais de 2km caminhando pelo monte, chamado pelos locais de serrote, até a tão buscada pedra furada. Mas naquele dia ela estava diferente. Bonita, brilhante, exposta e nossa.

                Naquele momento, como uma tela pintada com detalhes minuciosos, eu estava dentro de um sonho. Enfincado dentro de um pedido que fiz à Deus na véspera. Ele me deu de presente o pedido que fiz com tanto afinco e fé. Dali em diante qualquer imagem que saísse daquele ensaio seria uma obra de arte de ótica, sentimento e felicidade.



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